domingo, 31 de março de 2013

ouvindo blues

ouvindo blues

me conte o que não sei,
você me enlouquece
quando dança devagar
e eu me perco no sofá.
essas coisas é que fazem
o sujeito ser feliz
não importa se tem guerra,
se tem fome,
dívidas e miséria.
o que importa
é a serenidade dos teus olhos
contrastando com os quadris.
o blues vai na metade
e a garrafa vai no fim
mas isso não importa,
dance,
fique louca, quebre a taça,
tire a roupa
mas não pare,
por favor não pare,
de me olhar,
calmamente,
enquanto brinca
mexendo os quadris.

sexta-feira, 29 de março de 2013

náufragos

náufragos

pessoas mudam
o tempo vira
o barco afunda
uns se afogam
outros nadam para longe, mar à dentro,
para os dentes, deleite do tubarão,
poucos
quase ninguém
sobrevive
e isso não é certeza nenhuma,
pode-se enlouquecer na areia da praia,
uma vida de sal e de sol.
pode-se envelhecer na areia da praia,
uma vida de trabalho e sofá.
estar na areia
não é certeza
são poucos
que mantém os olhos abertos
durante o desastre
são poucos
que preservam a alma
durante a vida.

domingo, 24 de março de 2013

Panaceia

Panaceia

medicina, vitamina
Azitromicina
quantas mentes
quantos mentem
intenções assassinas
no banheiro, na sacada
no fundo da piscina
quantas mentes
quantos mentem
com a boca que saliva
a receita, obituário
sanduíche e cocaína
noite fria, morte lenta
Deus é a vaca que rumina
medicina, vitamina
chocolate e Ritalina
tudo é muito
e ainda é pouco
fonte de água cristalina
água benta, sabonete
hidratante e Aspirina
saca rolhas, dor de ouvido
o estouro e a buzina
medicina, vitamina
e o que mata é o leite
uva verde, melancia
estricnina.



segunda-feira, 18 de março de 2013

destruição em massa

destruição em massa

uma guerra que não acaba nunca
loucos em combate
diariamente
sem chance de exílio
a Suíça e o Pacífico
ficam do outro lado do campo
e nem mesmo no campo
conseguimos chegar
estamos presos pelos crachás,
o semáforo e o horário de almoço.
Cavamos trincheiras,
alugamos apartamentos,
bebemos,
e na madrugada
sem o som da TV
ouvimos a tropa de carros
colidindo e partindo
em todas direções.
Não existe resgate
a ambulância também quer socorro,
e quem não quer?
qualquer coisa que alivie
a tensão
somos soldados anônimos
expostos no front
sem receber o correio,
sozinhos,
nenhuma carta pra ler.

quinta-feira, 14 de março de 2013

envelope

envelope

vivo quase sempre
o constante fora de mim
num eterno desencontro
entre
remetente
destinatário
no papel que nem se vê
na parte interna do envelope.

quarta-feira, 6 de março de 2013

Desliga da Justiça (e aproveite)

Desliga da Justiça
(e aproveite)

O feriado acabou
o oxigênio também
ainda tem muito sabonete e papel higiênico!
e nós aqui
esperando não sei o que
do vento virar,
do oceano secar.
A fonte salgou
e o Diabo morreu,
deixou herdeiros sem vocação,
para a maldade gratuita.
E nós aqui,
tomando chuva, vento e gafanhoto.
Vou alugar o avião invisível,
e te deixar ir na janela,
eu sou o Aquaman
(que nunca faz nada)
e você é A mulher
(maravilha).

domingo, 3 de março de 2013

tango Oriental

tango Oriental

bem no fim da madrugada,
o tango Oriental,
mata a mulher amada,
castiga a mulher amada!
chorando em lamento
sabendo e sofrendo,
que canta,
por não poder tocá-la.
É a ilusão do que ama em silêncio
pois afinal ela existe,
e ainda é deslumbrante,
mesmo depois de tanto tempo,
tantos homens,
tantos lábios
e tantas flores.

sábado, 2 de março de 2013

o alienado

o alienado

Não acredita nas notícias
não confia no sistema
não sabe onde fica
nem a porta de saída,
nem seu lugar no teatro,
palco ou platéia?
Mesmo assim
é parte do espetáculo
desconfortável figurante
atropelado, invadido,
ignorado...
pela lei
pela ordem
pela massa sem rosto
que compra carros
que vende a alma
que mantém a calma,
nas filas do supermercado.
Não suspira, não se empolga,
com as capas das revistas
e as celebridades do momento
e suas vidas perfeitas.
É o alienado,
que ofende em silêncio
que aplaude em escárnio
toda perfeição fabricada,
desde que o mundo é mundo
e Platão
inventou o Photoshop.